Desabafos de uma jornalista, aspirante a atriz, shiatsuterapeuta e professora de yoga...

quinta-feira, junho 09, 2005

Meu pai, essa caricatura

Meu pai é triste de agüentar, mas tenho que reconhecer que ele é uma comédia. Quando criança amava desenhar e dizia que trabalharia para o Maurício de Souza, tinha traço de HQ, mas meu pai me traumatizou me matriculando num curso de desenho técnico em que tinha que usar esquadro e régua! Via as crianças que caíam serem consoladas pelos pais e não entendia pq tinha que me levantar correndo quando me esborrachava no chão sem abrir a boca, mesmo com sangue pingando, para “não ganhar motivo para chorar de verdade”. Papai era capaz de me esfolar quando simplesmente dizia que não queria comer, pq raios, ainda como igual passarinho, apesar de todos os esforços de mamãe para que comesse de tudo. Ele é a pessoa mais contemplativa da face da terra. É capaz de andar como uma lesma na Marginal só para admirar uma espécie qualquer de pássaro que tenha cruzado o caminho, mesmo com tantas buzinas e xingamentos de motoristas tentando andar rápido. É também o mais irritadiço dos seres. Mas só com coisas tolas, que nas graves ele não se altera. Lembro de quando vovô, o pai dele, estava no hospital, entre a vida e a morte, ligaram dizendo que não passaria daquela madrugada, eu e a mamma perguntamos se queria ir até lá passar as últimas horas com ele, mas o patriarca não se alterou, voltou para a cama, dormiu, só foi mesmo quando o velório já estava rolando... Em compensação uma das cenas que guardo do meu casamento é que quando a mestre de cerimônia botou todos os padrinhos para dentro e nos fechou para fora, tive medo que os convidados ouvissem o ariano típico reclamando: “Abre essa m... Não agüento essa p... desse frio!” E naquele dia, em que eu não enxergava nada pois estava sem óculos e não posso usar lentes, quis pela primeira vez fazer o percurso de forma lenta e devagar para ver se identificava alguém, mas ele desembestou a andar rápido como nunca vi e como casei numa capelinha, foi mais rápido do que gostaria a grande noite. Sempre tive dificuldades com lento e devagar no teatro... Papai é tão lerdo, que a piada no bairro é que quando ele oferece carona, as pessoas agradecem: “obrigada, mas estou com pressa”. Ele foi capaz de dizer palavrões na minha orelha a vida toda, mas tem a cara de pau de perguntar hoje “com quem aprendi a falar tanta besteira”, sendo que sou filha única e minha mãe não fala. Parecemos dois rinocerontes tentando fazer carinho: um coice, um cafuné. Ele sempre me enganou com seus comentários racistas que me faziam subir no palanque e discursar pela igualdade, mas quando foi para Bahia e voltou com um CD de capoeira, percebi que como tantos que me conhecem, só fazia para me provocar. O tratamento mais carinhoso que me confere é “sua besta”. Já tivemos discussões telefônicas homéricas capazes de fazer corar colegas de trabalho, que não acreditavam que “falava com meu pai daquele jeito”. Hoje entendo quando minhas tias diziam que eu só poderia dar o que recebi e definitivamente sempre fomos estúpidos um com o outro. Mas nunca dura mais que cinco minutos, depois já estamos agarrados. Sempre que choro nas entressafras de desemprego, ele diz que me avisou para ser engenheira ou médica, mas quem mandou fazer jornalismo... Já disse que até ele deve escrever igual ou melhor que eu, no melhor estilo qualquer um escreve!. Acha que depois de anos teimando nessa área devo desistir e fazer concurso para bilheteiro do metrô. Mas por essas e outras impublicáveis, fiquei super feliz ontem, quando eu disse que qualquer coisa em exatas ou biológicas davam retorno mais líquido e certo que humanas ou artísticas e ouvi dele: “mas fazer o que se você não tinha dom nem para uma coisa e nem para outra?” E ele ainda me levou para namorar uma Yamaha Neo, mesmo sabendo que ainda tenho que evoluir do estágio de parar de cair na calçada esburacada! Esse é o meu pai. Um cavalo doce. E eu não poderia ter me tornado outra coisa a não ser uma égua meiga!

3 Comments:

Blogger Carol Mendonça said...

Égua meiga, Ditona, Sua Besta ....
quanto carinho!!
Seu pai está perfeitamente descrito e eu rolando de rir. Eram tão engraçadas suas brigas ao redor da mesa .... come Francine!!

9:46 AM

 
Blogger T.M.Scavone said...

"O sua Besta! Come tudo o que tá no prato!", Fran vc descreveu muito bem o seu pai e lendo como não deixar de lembrar, aquela vez que ele ficou correndo atrás de vc, em volta da mesa, lembra?

Bjs.

2:03 PM

 
Anonymous Anônimo said...

Fran, só você para transformar meu dia, que acordou depressivo, e meu plantão, em algo divertido. Beijocas, Cris

6:37 PM

 

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