Desabafos de uma jornalista, aspirante a atriz, shiatsuterapeuta e professora de yoga...

quarta-feira, maio 31, 2006

O Amor Bate na Aorta

Cantiga do amor sem eira nem beira,/ vira o mundo de cabeça para baixo,/suspende a saia das mulheres,/ tira os óculos dos homens,/ o amor, seja como for,/ é o amor.

Meu bem, não chores,/ Hoje tem filme de Carlito!

O amor bate na porta/ O amor bate na aorta,/ fui abrir e me constipei./ Cardíaco e melancólico,/ o amor ronca na horta/ entre pés de laranjeira/ entre uvas meio verdes/ e desejos já maduros.

Entre uvas meio verdes,/ meu amor, não te atormentes./ Certos ácidos adoçam/ a boca murcha dos velhos/ e quando os dentes não mordem/ e quando os braços não prendem/ o amor faz uma cócega/ o amor desenha uma curva/ propõe uma geometria.

Amor é bicho instruído.

Olha: o amor pulou o muro/ o amor subiu na árvore/ em tempo se estrepar./ Pronto, o amor se estrepou./ Daqui estou vendo o sangue/ que escorre do corpo andrógino./ Essa ferida, meu bem,/ às vezes não sara nunca/ às vezes sara amanhã.

Daqui estou vendo o amor/ irritado, desapontado,/ mas também vejo outras coisas:/ vejo corpos, vejo almas/ vejo beijos que se beijam/ ouço mãos que se conversam/ e que viajam sem mapa./ Vejo muitas outras coisas/ que não ouso compreender...

Carlos Drummond de Andrade

[Gozado, estou relembrando de trechos de poesias que decorei na época em que me atrevia a fazê-las, claro que com menos propriedade, mas certamente com o mesmo sentimento. Teriam elas deixado em mim um ranço romântico, sonhador e idealista, que tenho combatido, mas volta e meia me faz ter dificuldade de aceitar a realidade? De novo, a pegadinha da memória - "Mundo, vasto mundo, mais vasto é meu coração"]

segunda-feira, maio 29, 2006

EU TE DEVORO

Teus sinais/ Me confundem da cabeça aos pés/ Mas por dentro eu te devoro/ Teu olhar/ Não me diz exato quem tu és/ Mesmo assim eu te devoro/ Te devoraria a qualquer preço/ Porque te ignoro ou te conheço/ Quando chove ou quando faz frio/ Noutro plano/ Te devoraria tal Caetano/ A Leonardo di Caprio/ É um milagre/ Tudo o que Deus criou/ Pensando em você/ Fez a via-láctea/ Fez os dinossauros/ Sem pensar em nada/ Fez a minha vida/ E te deu/ Sem contar os dias/ Que me faz morrer sem saber de ti/ Jogado à solidão/ Mas se quer saber/ Se eu quero outra vida/ Não, não. / Eu quero mesmo é viver/ Pra esperar, esperar/ Devorar você
[Obrigada meu Deus pelos compositores e poetas brazucas sempre nos salvarem da pieguice na hora de por as cobras e lagartos para fora - afinal poesia de anônimos é coisa que só familiar e amigo gosta e olhe lá. Não por acaso meus "livros" nunca saíram do papel e do computador. Muito crítica? Maybe. Mas essa música ainda me lembra uma época de oba oba do jornalismo, quando eu a globalizada Juliana Soares estagiávamos na Kiss FM, antes de um de seus fechamentos e ganhei ingresso pro show do fofo do Djavan, pois a rádio era do mesmo grupo da Alpha FM - pena que rádio ou se faz durante a facu ou não se sobrevive após a formatura com ela. Pena que não fui eu quem ganhou um selinho dele nessa apresentação. Sim, assim com a saudosa Ju, também tenho meus momentos de gosto discutível. Sorry pelas longas aspas, mas hoje estou com a corda toda...]

O Prodígio do Mundo Ocidental

Sempre brinco que tenho mais surpresas positivas com atores não globais do que com os famosos pela carreira de TV. Ontem comprovei isso e também minha teoria que o Sesc nunca põe peça sofrível em cartaz e sempre tem soluções cenográficas criativas. Tem melhor fim de domingo que esquecer da vida na platéia (acho que só estando no palco), bem longe da angustiante musiquinha do Fantástico? Nessas horas dá uma saudade e tanto das oficinas de teatro que me fizeram apaixonar pela encenação – pena que elas exijam mais tempo e dedicação do que o jornalismo me permite dar no momento e que já conheci a segunda paixão da minha vida quando a de infância – escrever - já me sustentava, mas isso são outros quinhentos, assunto para outro texto, com mais cara de desabafo que de resenha.

Pausa para uma aspas explicativa do meu surto “tenho que escrever sobre minha paixonite por peças e filmes”. Não é exagero classificar o jornalismo de província: todos se conhecem e como fofoqueiros profissionais, falam um do outro, como em cidade de interior. Para reforçar isso, somos divididos em bolhas: a dos assessores de imprensa, a dos que trabalham com comunicação interna em empresas que não tem a ver com jornalismo/ comunicação [ah, esses sortudos – suspiro] os que trabalham em rádio, em TV, jornal, revista, agência e site. Temos ainda as subdivisões das editorias: os que caíram de pára quedas em assuntos que nunca sonharam cobrir e ficaram para sempre marcados como profissionais de política, economia, esportes, tecnologia, internacional... Em TV temos ainda o racha entre os anônimos pauteiros/ produtores que ficam com o grosso da apuração e agendamento de entrevistas e os repórteres que pegam a coisa toda tão mastigada que na maior parte das vezes só engolem mesmo. Aliás, adoro reportagem de TV justamente por ter muito mais de cênico que de jornalístico. Em cultura há os que passam a vida escrevendo de teatro, de cinema, de gastronomia... Por essas e outras, só posso bancar a crítica aqui mesmo. Familiares e amigos íntimos nas áreas de interesse são decisivos para chegar ao que se sonha – mas como diria o Osho, o que se imaginamos é sempre melhor em nossa viagens do que quando acontece de fato... Fecha aspas e vamos ao que interessa.

Como se não bastasse o Sesc sempre dar espaço para boas histórias, os preços são sempre camaradas – na medida dos salários minguados de quem sonhou cobrir uma guerra (já até pedi para familiares suspenderem a reza anti correspondente de conflito do gênero nas fases mais idealistas)... E a cenografia nunca deixa a desejar, é sempre um capítulo à parte no encantamento inicial, faz parte de entrar no clima e se envolver antes da história começar, enquanto ainda nos sentamos e aguardamos as surpresas boas que envolvem todo esse universo. O Prodígio do Mundo Ocidental foi encenada no quintal do Sesc Ipiranga, onde já vi cantores sofrerem da falta de acústica, mas tiveram uma idéia e tanto: envolveram com plásticos uma área coberta onde geralmente se fazem shows, aulas abertas e barracas de festa junina. Era gostoso ouvir os personagens e vê-los chegando antes de entrarem no “palco” improvisado. A “lareira” ajudou a esquecer o frio e acreditar que aquilo era mesmo um boteco de quinta lá no cinturão do whisky. Aliás não me lembro de ter visto nada de autor irlandês – a montagem com sotaque caipira nos fazia sentir num rincão do interior de São Paulo ou Minas. Bacana aproximar universos diferentes e encontrar semelhanças neles.

A história é de se fazer pensar: um mentiroso é elevado à categoria de herói por seu crime – provável alusão ao quanto damos valor ao que não merece – e quando a verdade é revelada, todos viram as costas ao personagem que há pouco tempo era endeusado por seus feitos – uma mostra que descartamos fácil nossos ídolos ou que os tais 15 minutos de fama pregados por Andy Warhol não são tão recentes quanto imaginamos. Só que a forma como a tradução foi montada nos diverte do começo ao fim – o tal pensamento crítico chega aos 45 minutos do segundo tempo, sem estragar aquele passeio cultural que a maioria prefere que seja do tipo “rir, mas não ficar muito pensativo”, ao mesmo tempo em que o expectador não sai como entrou, nem sente como se a humanidade não tivesse mais salvação. Tive a mesma sensação com “Um Circo de Rins e Fígados” do Gerald Tomas (surpresa! Ao contrário do que pregam as matérias sobre ele, entendi a peça!) no Sesc Vila Mariana – mas nesse caso há alternância de estocadas “como aceitamos coisas do tipo...” e “vamos rir pois ninguém é de ferro”.

A temporada dessa peça foi suspensa ontem para dar lugar à tradicional festa junina do Sesc Ipiranga – para os que não são da região, é ao lado do Museu do Ipiranga, que aliás, fica em frente ao Parque da Independência – depois de reformado pelo Banco Real, vale mais ainda uma visita dominical por ali. Mas O Prodígio do Mundo Ocidental volta no mês de julho – ao contrário da peça do Gerald, que já até tem história nova em cartaz. Não faço esse elogio todo só pela minha colega de cursinho que está no elenco – incrível como 11 anos sem se ver não afastam certos corações afins. Sou chata para peça sim, ainda mais para comédia, depois de ter visto os saudosos atores da TV Pirata em cena ao vivo. Só acredito que peça bacana precisa de empurrãozinho sempre – ainda mais quando é feita por atores que como diz outro artista baiano guerreiro, não aparecem em TV nem em propaganda de carnê do baú – por envolver trabalho hercúleo de sangue, suor e lágrimas. Só a arte salva!!

sexta-feira, maio 26, 2006

Terapia do Amor

Quando minha mãe chamou para ver esse filme, fiz a coitada ver Irmã Vap, de tanto que queria matar a vontade por ter perdido a peça. Mas nunca é a mesma coisa e ultimamente a onda de se filmar peças está numa maré alta... Trair e Coçar é Só Começar, Caixa 2... Mas voltemos ao que parecia uma comédia romântica mas se mostrou um filme nada clichê. Pouco tempo depois de fugir do Terapia do Amor, por medo do efeito contrário, numa quinta-feira voltando com amigos para casa (o famoso Expresso Santa Cruz), todos decidiram ver o bendito filme. Achei melhor encarar o longa com eles do que voltar sozinha para casa. Mas estava há dias num clima melancólico de frustração, culpa, decepção...

Uma das colegas que foi ao Shopping Metrô Santa Cruz odiou, esperava uma comédia romântica, reclamava que a Uma Thurman (tão feia que fica até engraçadinha de vez em quando e isso não é um comentário invejoso) não era engraçada, que seria melhor a Jenier Aniston no mesmo papel... Mas não achei que era para fazer rir, muito pelo contrário, o típico filme que toma rumo não óbvio – muito mais a minha cara!

A Meryl Streep, como a terapeuta Dra. Lisa Metzer, está – como não podia deixar de ser – sensacional. A Uma faz o personagem de Rafi, que está separando de um relacionamento de 9 anos e ouve dessa terapeuta alguns conselhos nada excepcionais, mas sempre vale a pena reforçar:

- Nove anos não se esquece do dia para noite!

Ou então:

- Você está renascendo para muitas coisas que julgava não serem mais possíveis!

Mais tarde a doutora também põe o filho no divã, aliás, namorado de Rafi, a saia justa e discussão ética mais divertida que conferi ultimamente:

- Você pode amar, aprender e seguir adiante sozinho!

O final não é previsível. Vale a pena pois apesar de ser filme americano (desculpe pelo pré-conceito), eles não estão salvando o mundo e nem extrapolado em demonstrar como são os bam bam bãs nos efeitos especiais. O que diverte não “força a amizade” como as comédias água com açúcar com ar de sitcom e suas risadas gravadas. É praticamente uma terapia fast food, com uma história verossímel – um prato cheio pra jornalista viciado em realidade (biografias, documentários)...

quinta-feira, maio 25, 2006

Drummond sempre!

Amar o perdido deixa confundido este coração.
Nada pode o olvido contra o sem sentido apelo do Não.
As coisas tangíveis tornam-se insensíveis à palma da mão.
Mas as coisas findas, muito mais que lindas, essas ficarão.

Salve o poeta mais brazuca de todos os tempos!

R$ 1.99

Era um meio de semana cinzento, desses em o stress insano do trabalho provoca uma epidemia de profissionais cutucando suas gastrites anonimamente, até a hora de por o pé na rua e chorar as pitangas – pros amigos ou pro vento mesmo, tanto faz. Um convite para uma peça surge como uma luz no fim do túnel. Como era dia de botar os bichos pra fora na aula de pilates na bola, a empreitada é encarada com má vontade, mais ainda pelo trânsito encontrado naquele fluxo “quarta-feira é dia de jogo imperdível”.

Quão grata foi a surpresa de chegar no Teatro Folha d Shopping Higienópolis e assistir o baiano Ricardo Castro no monólogo R$ 1.99, que dosa muito bem momentos de risada e descontração com reflexão e sutil estocada nos previsíveis e insistentes problemas brasileiros. E pensar que ele fez tudo sozinho: escreveu, produziu, iluminou, ensaiou... Tudo com a intenção de fazer poucas apresentações a preços módicos e ir embora para Barcelona, cansado que estava de abrir a geladeira e só encontrar “vento”.

Mas artista brasileiro é tão guerreiro e a peça deu tão certo que está em cartaz há sete anos e segundo o ator, foram as melhores surpresa e presente que poderia receber. Claro, o ingresso já não está tão barato – R$ 13, se não me falha a memória, mas a julgar pela qualidade do espetáculo, é uma bagatela e tanto. Poucos momentos são tão encantadores quanto esquecer da vida no teatro – tanto no palco, quanto na platéia - e deixa-se hipnotizar com a mesma pessoa dando o texto de forma não mecanizada, se movimentando pelo palco, subindo o som, mudando a luz...

Castro é multimídia, globalizado, multifacetado, tem jogo de cintura como poucos. E soube como brasileiro que é e não desiste nunca, fazer da dificuldade uma alavanca – que entretém e faz pensar, que não permite que os expectadores saiam da platéia como entraram. Ok, confesso: como a irmã de um amigo fez o figurino dele, a noitada terminou em grande estilo no Sujinho – mas essa ode ao ator não vem do fato de que ele ainda por cima é gente boa. Vem da causa justa que teatro bom merece ser aplaudido. E feito por anônimos – quero dizer não globais – merece palmas em pé.

terça-feira, maio 09, 2006

Férias Significativas